Mudança de mindset é um dos termos polêmicos atuais, daqueles que algumas pessoas têm aversão de escutar, enquanto outras usam demasiadamente de forma superficial, quase como uma solução mágica / rápida para os problemas e como se mudança de mindset fosse algo tão simples quanto piscar. “É só mudar o mindset“. Aperta o botão que muda.

Considero que é preciso entender que mudança de mindset, ou mudança de mentalidade (traduzindo para o nosso idioma), é sim uma chave importante para mudanças comportamentais e novos resultados, mas é preciso ir além da superficialidade para entender (1) como isso ocorre na prática, (2) que é um processo que requer investimento e pode levar tempo e, além disso, (3) é preciso checar com cuidado quais resultados obtidos são causa e consequência reais decorrentes da mudar a mentalidade e, por exemplo, “pensar positivo”

Compartilho aqui dois trechos do livro “Terapia Cognitivo-Comportamental – teoria e prática”, que explicam um pouco isso. Lembrando que a base para essas informações remonta a estudos científicos iniciados na década de 1960 e continuam até hoje:

“Quando as pessoas aprendem a avaliar seu pensamento de forma mais realista e adaptativa, elas obtêm uma melhora em seu estado emocional e no comportamento.”

“Para que haja melhora duradoura no humor e no comportamento do paciente, os terapeutas cognitivos trabalham em um nível mais profundo de cognição: as crenças básicas do paciente sobre si mesmo, seu mundo e as outras pessoas. A modificação das crenças disfuncionais subjacentes produz uma mudança mais duradoura. Por exemplo, se você continuamente subestima suas habilidades, pode ser que tenha uma crença subjacente de incompetência. A modificação dessa crença geral (isto é, ver a si mesmo de forma mais realista, como alguém que tem pontos fortes e pontos fracos) pode alterar sua percepção de situações específicas com que se defronta diariamente”.

Com base nesses trechos, você pode perceber que:

1) Com a mudança da mentalidade, novos comportamentos e emoções podem surgir, logo, resultados podem ser diferentes. Então, mudança de mentalidade faz todo sentido, sim, quando falamos de melhorias na vida pessoal e profissional! Precisamos revisar nossa forma de pensar, isso é um fato. É possível que por motivos diversos, tenhamos desenvolvido formas de pensar desajustadas ou não adaptativas ao nosso momento atual, mas que podem ser transformadas. Isso pode ocorrer em nível individual e coletivo.

2) Como também podemos ver, existem crenças mais nucleares e profundas, que podem ser base inclusive para alguns transtornos como depressão e ansiedade, que precisam de acompanhamento de um profissional capacitado e que requerem um tempo de processo, por exemplo, na Psicoterapia.

Por isso, é preciso tratar o tema com profundidade e cuidado.

Muitas vezes, em nossas organizações ou contextos pessoais, deixamos “a lição” para o outro, de mudar sua mentalidade e “pensar positivo”, enquanto não oferecemos o melhor ambiente e condições para que isso ocorra.

É claro que como indivíduos adultos somos responsáveis pela nossa transformação, mas também somos agentes de transformação social. Como podemos contribuir com as mudanças positivas na forma de pensar das pessoas ao redor, para que sejam mais ajustadas e adaptativas?

E especificamente sobre o “pense positivo”, muitas vezes ele aparece como afirmação generalizada e resposta rápida diante de uma dificuldade que o outro enfrenta. É só isso que podemos oferecer às pessoas? Para dar novas respostas, precisamos escutar mais e entender a complexidade de alguns fenômenos.

Nem tudo é sempre causa e consequência imediata. Vide a situação que vivemos da Pandemia. Quantos profissionais incríveis fora do mercado? Quantos negócios construídos com tanta competência e bem geridos, que fecharam as portas. Será que foi falta de “pensamento positivo”?

É claro que pensamentos otimistas e esperançosos fazem diferença em nosso desempenho e na perseverança em busca de objetivos. Precisamos disso pra esse momento! Porém, esse conceito muitas vezes é usado de forma exagerada e distorcida, como causa e consequência totalmente direta e idealizada do que obtemos (ou não) em nosso percurso:

“Pense positivo” e não terá mais problemas.

“Pense positivo” e o dinheiro virá.

“Pense positivo” e tudo se resolverá.

Isso eu tenho muito claro pra mim: cada um de nós pode gerar pensamentos mais produtivos, funcionais e adaptativos, e isso é ótimo, necessário, saudável. Faço isso como meu trabalho – ajudar as pessoas a identificarem e transformarem pensamentos que não levam a bons lugares ou a lugares que querem ir.

Mas ao mesmo tempo, vejo situações em que é uma fase do processo procurar ajuda, se restabelecer e não há problemas em ter alguns “pensamentos negativos”, sentir dor, tristeza, não “vencer tudo pelo poder da mente”. Tem dias que precisamos ser “levados no colo”, outros dias seguimos lado a lado, outro dia damos suporte a alguém, e isso é ser um ser social. Ora contribuímos com o outro, ora precisamos de ajuda. Se entendermos que nem tudo é “pensar positivo” de forma simplista (e não verdadeira), a vida se tornará mais leve.

Cada um possui o que é uma superação em sua história. Não é igual para todos. Não tem uma chave única. Nem sempre é causa e consequência imediata. A vida é um composto de elementos.

Pra fechar, penso que cabe a nós:

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